Tudo era assustador e ninguém estava assustado
«Vivia-se em público; comia-se em mesas armadas em frente das portas; as mulheres, sentadas nos adros das igrejas, faziam fios cantando A Marselha; o parque Monceaux e o Luxemburgo eram campos de manobra; havia em todas as ruas fábricas de armas a funcionar, faziam-se espingardas à vista dos transeuntes que batiam palmas; só se ouviam estas palavras em todas as bocas: Paciência. Estamos em revolução. Sorria-se heroicamente. Ia-se ao teatro como em Atenas durante a guerra do Peloponeso; lia-se nos cartazes pelas esquinas: O cerco de Thionville. – A mãe de família salva das chamas. – O Clube dos Sans-Soucis. – A papisa joana mais velha. – Os filósofos soldados. – A arte de amar na aldeia. – Os alemães estavam às portas; corria o boato que o rei da Prússia tinha mandado guardar lugares na Ópera. Tudo era assustador e ninguém estava assustado.»
Noventa e Três, Victor Hugo (Trad. Maximiano Lemos Júnior, Ed. Portugália, p. 99)