Um pecado pouco original
Passeio de bicla dominical. Entro numa capela e logo à entrada vejo encostado a uma parede o carrinho da última viagem. Recepção nada agradável. Alguém saiu tão à pressa que nem teve tempo de arrumar o nosso último transporte. Mais uns passos e vejo a luz. Quer dizer, não vi bem, porque tinha uma cortina a tapar a janela, mas o sol parecia querer entrar a toda a força. A cortina quase derretia tal a intensidade solar. Resolvir sair. O carrinho continuava ali à entrada. Fingi nem reparar nele. Ignorei-o.
Na viagem de regresso vejo uma placa na estrada: “visite a nossa terra, uma história singular”. Esta mania de ser original, singular, já irrita. Todos pensam ser originais e únicos quando as histórias têm quase sempre um santo, um milagre, um animal, um relato geográfico por trás. Tretas. Avanço mais uns quilómetros e à porta da igreja dessa “terra singular” está um enorme cartaz onde diz “Só Cristo se salvou do sofrimento e do pecado”. Pronto, mais uma vez foi o único. Esta gente tem a mania da singularidade. Pensam que são todos originais. Então se foi o único que se salvou para quê segui-lo e imitá-lo? Que mensagem mais derrotista e nada original.
Continuo a rolar. Agora junto à praia. Na areia vejo meia dúzia de flores amarelas selvavens. Ainda pensei arrancar uma e colocar em água para me lembrar deste passeio durante a modorrenta semana. Mas lembrei-me daquela música “quando alguém nasce, nasce selvagem, não é de ninguém”. Desisti. Letra pouco original. Aquelas flores selvagens junto à água salgada e sempre batidas pela nortada não mereciam ser arrancadas. Essas sim, singulares.
Este post, sim, é original e único. Quer dizer, que ganda treta.
© MCS
GostarGostar
Credo…
GostarGostar
Pois… 🙂
GostarGostar