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“Crepúsculo dos Deuses”

Novembro 26, 2011

Sunset Boulevard” (1950), Real. Billy Wilder

Quando acabei de ver este filme pensei: mas que bela homenagem ao cinema. Aquela estrela do cinema mudo até falou para mim e tudo, ela sabia que eu estava ali a vê-la, apesar de não estar no escuro da sala como ela refere. Outros tempos estes. Um filme sobre uma diva do cinema mudo, produzido para ser visto numa sala de cinema e projectado numa grande tela, vi-o no pequeno ecrã. Em 110 minutos, passou-me à frente toda a história da sétima arte (um bocadinho, pronto): do mudo para o sonoro, das salas de cinema para a sala de casa, do grande ecrã para as 15 polegadas do computador. Razão tinha Norma Desmond (Gloria Swanson), “I am big. It’s the pictures that got small.” That’s right, Miss Desmond!

Aproveito o embalo e salto para o final, depois, se necessário, faço um flashback. O povo lá diz que são os tolos quem melhor vê a realidade e no meio deste quase meta-filme, será a demente diva quem dirá a verdade de entre todas as sãs personagens, isto é, onde começa a realidade e acaba a representação? “Just us, the cameras, and those wonderful people out there in the dark!… All right, Mr. DeMille, I’m ready for my close-up.” Concluindo, a última palavra cabe à personagem/actriz que aproveita para sair de cena/da realidade e dirigir-se aos espectadores/realizador. Absolutamente genial, não?

E agora a obra-prima. O título diz quase tudo, a estrela (sunset) que se apaga quando chega ao fim do seu percurso (boulevard).

A história começa com um crime, característica sempre presente num film noir. A câmara conduz-nos a uma casa típica daquela zona da cidade, onde uma estrela do cinema mudo vive enclausurada no seu palácio, no seu mundo de fantasia, agarrada às memórias dos tempos áureos de Hollywood dos anos 20, recusando-se enfrentar a realidade. O cinema agora é sonoro, a indústria de Hollywood vai fazendo o seu papel enquanto tal: usa e deita fora. No entanto, ela ainda sonha em regressar, aliás, retornar (“I hate that word [comeback]. It’s a return, a return to the millions of people who have never forgiven me for deserting the screen“) e representar um grande papel, o de Salomé, para o qual ela andou anos a escrever o argumento. Ela explica: Salomé apaixona-se por um príncipe, mas como não é correspondida, pede a cabeça dele num prato para que lhe possa beijar os lábios gelados. Bem, é aqui que entra o argumentista (William Holden) esmagado pelo cilindro de Hollywood, que se preparava para abandonar a cidade e voltar à sua terra natal, que lhe vai ajudar a reescrever esse argumento. E, mais uma vez, a história dentro da história começa a cruzar-se com a “realidade”. O palco está montado para que Norma Desmond possa representar o último e grande papel da sua vida.

Para ajudar à festa repare-se nisto. Gloria Swanson também foi uma estrela do cinema mudo que já se encontrava retirada das lides cinematográficas. Max, no papel de mordomo-ex-marido-ex-realizador, é interpretado por Erich von Stroheim, que foi realizador no período dourado do cinema mudo, chegando mesmo a ser despedido durante a rodagem de um filme após desentendimentos com Gloria Swanson e também passou por dificuldades na passagem para o sonoro. Cecil B. DeMille aparece como Cecil B. DeMille. Nancy Olson, a jovem que pretende ser argumentista em Hollywood, foi um dos nomes falados para o papel de Dalila, filme realizado por Cecil B. DeMille, que viria a ser entregue a Hedy Lamarr. E, como brinde, ainda temos um cameo de Buster Keaton. Repito: onde começa a realidade e acaba a representação?

4 comentários leave one →
  1. Bípede falante permalink
    Novembro 29, 2011 00:14

    Soberbo filme!
    Adoro a parte em que ele diz que ter cinquenta anos nem é nenhum problema a menos que se queira ter 25 rsrs
    beijosss

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    • Novembro 29, 2011 14:41

      Também pensei em destacar essa frase, pois é importante para filme. E este também se tornou o filme da vida para a Gloria Swanson. Imortalizou-a. Isto é, há muitos cruzamentos entre a realidade e a ficção nesta obra-prima.
      bjs

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  2. Abril 26, 2013 13:15

    Esta Obra é um dos grandes filmes de Hollywood.
    É obrigatória. Também o vejo como uma homenagem a todos os argumentistas, escritores que passaram por Hollywood, que levaram também para lá o seu sonho.

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    • Abril 26, 2013 18:29

      Sim, claro, grandes escritores também passaram/colaboraram com os estúdios de Hollywood.

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