‘Doutor Jekyll e Senhor Hyde’
«O Sr. Utterson, respeitável notário londrino, era um homem de expressão taciturna. Nunca o rosto se lhe abria num sorriso. No entanto, apesar do aspecto frio e azedo, não obstante a fisionomia inexpressiva, triste e sombria, havia nele qualquer coisa que atraía simpatias. Em reuniões amigáveis e quando descobria um vinho delicioso, transparecia nos seus olhos uma grande bondade. É certo que esta benevolência não se encontrava sempre na sua conversa, mas expressava-se no comportamento (depois de um bom jantar, por exemplo); e manifestava-se mais frequentemente ainda, e com mais força, na maior parte dos seus actos. Era austero, severo consigo próprio, e, quando estava só, limitava-se a beber gin, para reagir contra o seu gosto bastante pronunciado pelos vinhos velhos. E, embora adorasse o teatro, há vinte anos que não entrava numa sala de espectáculos. Era tolerante para com os outros: espantava-se muitas vezes com a facilidade que certos indivíduos indesejáveis encontravam na execução dos seus actos reprováveis, mas, mesmo em presença dos piores excessos, sentia-se sempre inclinado a socorrer, em vez de reprovar.»
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Doutor Jekyll e Senhor Hyde, Robert Louis Stevenson (Tradução de M. C. Gago da Silva, Ed. Amigos do Livro)