‘O rio e a guerra’
«Saiu do ventre da mãe em pleno dia, perto de um monte de estrume, perdido sob uma nuvem de moscas cor de esmeralda – de cabeça para a frente, patazinhas dianteiras bem esticadas. A primeira coisa que viu na vida foi uma bolazinha efémera azulada produzida por um obus, que rebentou mesmo por cima da sua cabeça. Enquanto o fumo se dissipava, um uivo estarrecedor atirou-o, corpozito ainda molhado, contra as patas da mãe. O horror foi a primeira sensação que experimentou na terra. O granizo fedorento da metralha fez plique-ploque nas telhas da cavalariça e salpicou a terra, obrigando a mãe do poldro – a égua ruiva de Trafime – a pôr-se de pé de um salto. No instante seguinte, porém, lançou um relincho curto e voltou a apoiar-se de flanco suado no monte salvador do estrume.»
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O rio e a guerra, Mikhail Cholokhov (Tradução de Alexandre Bazine, Ed. Campo das Letras)